Consumering

Se o marketing adapta um negocio ao mercado o que que fazem as empresas que se adaptam ao consumidor? Fazem Consumering. Um blog de artigos sobre como transformar uma empresa comercial num negocio de produtos preferidos pelos consumidores. www.consumering.pt

28/11/2005

Momento de Balanço

Será verdade que 2 em cada 3 profissionais de “marketing” não sabe bem ao que anda? Será possível? Será aceitável que gestores de marca com orçamentos milionários se orgulhem de (são citações):
- “atingir o objectivo, que era confundir o consumidor”
- “fazer uma campanha para alargar o target”
- “subir o posicionamento com a campanha”
- “posicionar a marca em diferentes segmentos”
- “associar outros valores (contraditórios) aos que já tem associados”
Não seria de esperar que algumas coisas básicas e fundamentais da profissão fossem tão evidentes que asneiras destas fossem ridicularizadas com uma gargalhada?

Já por aqui passaram diversas teorias explicativas para o problema, notavelmente a primeira explicação avançada foi a da diferença entre “contabilistas” e “financeiros” (ou entre “técnicos” e “engenheiros”) aplicada ao marketing. Veneravelmente, Hugo, o autor, defende que nas profissões costuma ser feita uma distinção entre os que sabem e os que fazem. Ou entre os que percebem e os que repetem. Diferença essa que não é aparente no marketing e que permite muito amanuense por aí ande com estatuto de executivo. Permite por exemplo que exista um curso de “Engenharia Publicitária” sem que este seja protagonista do anedotário profissional.
Outra explicação para o problema da fraca competência dos profissionais das marcas pode ser encontrado na diferença (ou falta dela) entre Comunicação Social e Comunicação Empresarial. Pela lógica uma só formação não pode gerar simultaneamente jornalistas e publicitários. Pela lógica, quem tem um código deontológico e uma missão para com a verdade (jornalista), não pode ser o mesmo que tem como objectivo manipular a percepção para a tornar mais interessante. Ainda por cima, os jornalistas costumam ser fracos a matemática e não há coisa mais perigosa do que por um orçamento de milhões nas mãos de quem não faz contas.
Estas duas explicações, são virtuosas, mas também são muito “rosseaunianas”. Colocam toda a culpa, não no homem, mas na sua deseducação. Como se por obra de um sistema educativo utópico, tudo se resolvesse. Mas na verdade, a educação é apenas mais um reflexo do problema e não a verdadeira causa. O sistema é um bom bode expiatório, mas os problemas tendem a estar com as pessoas (com os indivíduos).

Cada vez mais, parece-me que o carácter enganador e viciado da “gestão de marcas” resulta da genuína vontade dos decisores, dos proprietários das marcas (desde o CEO da multinacional aos eleitores de uma junta de freguesia) em serem enganados. A charlatanice depende da colaboração dos iludidos. Uma empresa/instituição mal gerida é como um organismo gordo. Consome demasiados recursos para produzir de menos actividade. A comparação não é nova, mas neste tempos de obesa pandemia, é mais fácil de perceber. Acontece que a generalidade dos gordos prefere ser magro, só que não está disposto a percorrer o caminho que os leva até lá. A dieta, o exercício, as restrições, a força de vontade, a sensação de injustiça, a auto-responsabilização. Perder peso é uma trabalheira. Muito pouco gratificante. Assim sendo, os obesos, estão sempre (secretamente) à espera de uma solução milagrosa, imediata e indolor para o seu problema. Os obesos, no fundo, querem acreditar numa solução imediata e por isso, periodicamente, deixam-se cair na ilusão dos xás, das massagens e de todas essas outras coisas que não implicam esforço, logo não gastam calorias, logo não resultam.
Esta alegoria pode explicar porque é que os vendedores da banha da cobra publicitária têm tanto sucesso. Anda por aí muita empresa gorda que prefere acreditar que não precisa de mudar de vida. Por exemplo: A Vodafone é considerada uma empresa de sucesso, mas conseguiu perder 20 pontos de quota num mercado fechado à concorrência; A PT parece um exemplo de gestão, mas extorque 700milhões de euros por ano (em assinaturas) para sustentar um bem (a rede fixa) que “comprou” ao estado por apenas 235milhões; A Galp, missionaria, internacionaliza-se, mas as espanholas vendem mais gasolina em Portugal do que vice-versa. Enfim, estas empresas, gordas, em mercados pouco concorrenciais, são a nata das nossas corporações. E como gordas que são não querem fazer dietas, nem aguentar ginásticas. Preferem antes que alguém lhes diga que são lindas assim mesmo, e que esse alguém as pinte e maquilhe, para que, por artes pouco dolorosas, passem de gordas a voluptuosas.

A obesidade na gestão é contagiosa. Repare-se na quantidade de vezes que se ouve declarações do tipo: “não há espaço no mercado para...”. Como se os mercados fossem um espaço limitado? Como se não fossem os mercados (concorrenciais) uma abstracção onde, quem for melhor tem sempre lugar, nem que para isso expulse quem já lá estava. Ora, estar preocupado com a resistência ao peso de uma cadeira, é uma preocupação típica de um obeso. E quem mede os mercados pelo número de empresas “que lá cabem” é um gestor com um pensamento obeso. Por exemplo: Durante anos disse-se que o mercado dos jornais diários estava saturado, e que DN e Público apenas persistiam porque tinham bolsos mais fundos do que as receitas justificavam. Até que, numa assentada, entram no mercado dois diários gratuitos que chegam a 2x mais pessoas do os “instalados” e, mesmo sem vender o papel, são lucrativos. Afinal havia espaço.

E pronto, demonstrado que a obesidade é um problema endémico dos gestores, falta só concluir que os obesos preferem tomar comprimidos a fazer exercício. E por isso há e haverá sempre no mercado receita para todos os “nutricionistas” que prometem emagrecimento sem esforço e nem restrições. Enquanto isso, os “personal trainers” das empresas, aqueles que investem no trabalho, na eficiência, na racionalidade, para gerir as marcas, verão a sua carreira ofuscada pela charlatonice. Com a única compensação de saber que no final, mais cedo ou mais tarde. Não se pode disfarçar o peso a mais e os mais aptos serão aqueles que, no longo prazo, vão ganhar a corrida. Ou não.

Ou talvez não. Talvez não haja moral no final desta história. Talvez a seriedade das vendas coabite com a charlatonice da notoriedade da publicidade. Talvez o futuro seja ainda mais confuso do que já é o presente. Mas uma coisa é certa. Um ano depois do lançamento do “Compre Este Porque” passou por aqui gente que leu, que gostou e que se deu ao trabalho de o dizer. Noesis, RuiPaiva, Bruno, Rayban, são algumas das e-personalidades que me obrigam a persistir. E a quem (juntamente com os outros que estão na página de agradecimentos do livro) recorro agora num momento de indecisão.

- O artigo 14.MPE foi o último da série, vitima da sua própria pequenez e da falta de interesse editorial (foi recusado por uma quantidade demasiado grande de publicações).
- Por ter esgotado a fórmula, a segunda época no Meios&Publicidade não tem mais um grande objectivo final (como tiveram os artigos que originaram o “Compre Este Porque”) e limita-se a ser o que é. Um espaço de opinião que faço por merecer.
- O atrevimento do “Sexo no Supermercado”, iniciado com uma divertida crónica para a Cosmopolitan, resultou em divórcio motivado pelas insanáveis diferenças entre os próprios sexo e supermercado.

Estou por isto tudo em momento de balanço. Em nome da “boa” gestão de marcas como prosseguir? Como fazer melhor do que já está feito no “Compre Este Porque”? O que faz falta ou pode fazer a diferença para as marcas? Aceitam-se sugestões. Agradeço ao ilustre painel que por aqui opina, que o continue a fazer.

18/11/2005

14 (mpe) – Se não se percebe a estratégia é porque não há estratégia

Num mercado competitivo, a sorte sorri aqueles que merecem a preferencia dos clientes. O que em termos mais práticos significa que, os negócios melhor sucedidos são aqueles que explicam tintim por tintim aos seus potenciais clientes que comprar ali é melhor do que desperdiçar dinheiro na concorrência. Uma explicação da vantagem competitiva que se convencionou chamar de Motivo de Compra.

Ora acontece que muitas vezes nos perguntamos porque é que um cliente deve preferir ser cliente de um banco ou de uma gasolineira e não conseguimos perceber qual o motivo. É fácil fazer a experiência. Pense um pouco nas empresas das quais é cliente e tente lembrar-se se alguma vez lhe disseram do motivo porque essas são melhores do que a concorrência. Não sabe. Ninguém sabe. Mas mesmo assim essas grandes empresas têm departamentos de marketing cheios de gente bem paga para lhes tomar conta da marca. Então como explicar este fenómeno?

É triste constatar, mas a verdade, nua e crua, é que essas empresas, com bolsos fundos, não têm marketing. Ou por outra, o marketing que têm é mal feito, por isso é como não o ter. Sim, é verdade. Lá porque têm muito dinheiro para fazer publicidade, não quer dizer que a façam bem feito. E para ter a certeza que está mal feito é só tentar preencher o seguinte espaço: “Compre Marca (em vez da concorrência) porque __________________________”. Se não sabe como preencher este espaço e mesmo assim a empresa anuncia abundantemente então quer dizer simplesmente que o dinheiro que eles gastaram foi desperdiçado.

Os empresários e gestores de pequenas empresas costumam ser pessoas com o bom senso de pensar que se uma grande empresa tem determinada despesa é porque sabe o que faz e há uma razão para tal dispêndio. Mas este é um dos casos em que o bom senso é inimigo da inteligência. Mesmo que pareça, sempre que de uma marca, por mais rica que seja, não se perceber o motivo porque esta é melhor do que a concorrência só há uma explicação. A marca está a ser mal gerida.

A única diferença é que uma grande empresa, como um banco, pode desperdiçar dinheiro em coisas inúteis, mas isso não se nota nos lucros ao fim do ano. Afinal essa é a diferença entre uma grande e uma pequena empresa. Uma grande pode fazer asneiras que ninguém repara e ainda sobra dinheiro para tapar a asneira. Ora, numa pequena empresa que se preze, gastar dinheiro para nada significa ter prejuízo e ter prejuízo significa ter dificuldades em assumir as despesas. Não se podem dar ao luxo.

As pequenas empresas não podem se dar ao luxo de anunciarem sem que se perceba para que raio anunciam. Mesmo que seja um pequeno anuncio no Dica da Semana, esse investimento é precioso, não pode ser desperdiçado. Logo, pergunte-se a si mesmo: Quem ler isto será capaz de perceber o meu motivo de compra? Será que o público vai ver o anuncio e perceber que: “comprar aqui em vez de comprar noutro lado qualquer é melhor porque _________________”?

Se a resposta a esta e pequena singela pergunta for um bocadinho vaga então está na altura de soar o alarme, é dinheiro desperdiçado. Leia-se. Qualquer peça de publicidade que não dê para um tipo qualquer perceber só de olhar por um instante porque é que aquela empresa deve ser preferida em vez da concorrência é uma má peça de publicidade. Não há desculpas.

Em alternativa boas peças de publicidade são aquelas que à primeira vista de percebe porque é que a empresa anunciante deve ser preferida em vez da concorrência. Essas sim, têm o potencial para se tornarem num investimento rentável. Mas atenção. Aquela coisa do à primeira vista não é por acaso. Como em todas explicações só há espaço para um argumento de cada vez.

13/11/2005

13 (mpe) – Nem tudo o que tem nome em inglês é ouro

Algumas grandes empresas alegam que a razão porque gastam tanto dinheiro em anúncios é para que a publicidade tenha notoriedade e associe valores à marca, reposicionando-a em segmentos, como um factor de diferenciação, capaz de contrariar, pela construção de um território, a tendência de equivalência entre produtos. Ora bem, mas que bela confusão! Se é por isso que as empresas grandes fazem publicidade, então, ainda bem que as pequenas empresas não têm dinheiro para estes luxos. Gastar em publicidade sem saber que resultado esperar é uma das formas mais eficientes e rápidas de torrar dinheiro.

Digam o que disserem os publicitários, a publicidade (e as outras acções equivalentes) servem exclusivamente para vender. Não servem para mais nada. Como tal, se por via de um qualquer esforço publicitário (a presença numa feira, um anúncio de jornal, ou até uma campanha multimédia) o resultado obtido não foi um aumento das vendas, então podem estar certos. Foi dinheiro mal gasto.

Ainda assim, criou-se nas cabeças de alguns empresários e gestores, com síndrome de carneirada, a impressão (infundada) que pode haver outras razões para as empresas gastarem dinheiro em publicidade. Normalmente são essas razões daquelas baboseiras disfarçadas de inglês que todos repetem mas poucos sabem o que querem dizer: o branding, o benchmarking, o top-of-mind. Tudo coisas que não parecem valer muito dinheiro (porque não são vendas) mas todos imaginam custar uma pipa de massa.

Nestas coisas do marketing, é até bom que as pequenas empresas não possam desperdiçar recursos. Ao menos assim escusam de fazer de tontos ao gastar avidamente em coisas que nem imaginam para o que servem. Infelizmente não é único o caso do empresário que gasta o que não tem em publicidade e o faz sem saber para o quê. Mas quererá isto dizer que as pequenas empresas não devem anunciar? Nada disso e antes pelo contrário. Todos os negócios que precisam de vender devem anunciar. Convém é que saibam o que anunciar.

Já vimos, a publicidade só serve para vender. Então como se faz o milagre? Simplificando uma ferramenta cuja explicação e aplicação é bem mais longa do que isto (e que vai tomar algumas destas páginas) a publicidade vende sempre que se explica a um potencial cliente a razão para preferir determinado produto em relação aos concorrentes.

Imagine-se que uma oficina coloca um cartaz para a rua a dizer: “reboque gratuito”. Isto pressupõe que quem passar na rua se irá tomar nota do número de telefone e da próxima vez que o carro avariar se lembrará de ligar para ter o carro arranjado sem ter de encomendar o reboque de um lado e a oficina do outro. Se tudo isto acontecer, então o cartaz é publicidade e da boa.

Boa publicidade é quando se divulga uma coisa e acontece tudo isto que se viu no exemplo anterior. Tem de o cliente reparar, deve ficar interessado, e vir a precisar de semelhante coisa. No caso do reboque, aquele cartaz valeu o seu peso em ouro. Mas, por outro lado, se não tiver o efeito desejado, se ninguém vir o cartaz, se o reboque for coisa que ninguém precisa, ou se ninguém perceber o que tem escrito, então é um flagrante caso de má publicidade.

Má publicidade é toda a publicidade que não se traduz em vendas. E há duas razões para o desastre, a primeira delas é porque o marketing (nota: marketing é algo parecido com a ciência que permite fazer boa publicidade) não é uma ciência exacta e por isso ninguém pode garantir que o bom trabalho sempre dê bons resultados. Já a segunda razão para se fazer publicidade sem conseguir vendas acontece sempre que um cliente, ao ver a publicidade, não percebe porque é que há de preferir o produto em vez de um concorrente, como se verá depois.

06/11/2005

15.II) Trabalhem menos

Onde quer que se encontre um departamento de marketing é comum descobrir por lá uma doença parasitária e debilitante. Seja na mais pequena empresa de importações, até ao maior serviço privatizado, são muitos os departamentos de marketing que sofrem da doença, uma enfermidade que de tão vulgar, passa despercebida aos gestores que cuidam de a alimentar.

Esta proeminente doença é o excesso de iniciativas, e verifica-se sempre que o marketing faz demasiadas coisas, ignorando até quando com essa prolixidade se prejudica. Em linguagem de leigo, a maleita de que sofrem os departamentos de marketing é o excesso de trabalho. O que é uma doença bem estúpida de se ter, porque o trabalho não engrandece ninguém e dá uma grande trabalheira a fazer.

Tal doença do excesso de iniciativas aparece sempre que na organização se ignora uma das mais básicas e facilmente demonstráveis regras da publicidade. A regra do efeito de escala. Todo e qualquer gestor de marca, marketeiro, publicitário, ou afim, mesmo os mais fraquitos, deveriam saber que o dinheiro aplicado numa iniciativa rende melhores resultados do que esse mesmo valor repartido entre duas iniciativas distintas. Ou doutra forma, fazer uma só coisa e em grande é melhor do que fazer muitas coisas mas pequenas. Já desde o tempo dos avós que se sabe que é com repetição que se faz a propaganda.

Assim sendo, todos os departamentos de marketing deveriam saber que o seu plano de actividades tem forçosamente de ser pequeno, com os recursos concentrados e as apostas bem definidas. Afinal, se se vai fazer uma coisa, uma acção, é porque essa coisa resulta, vai daí, mais vale é fazer a coisa em grande. Do mesmo modo, se há duas coisas para fazer, sempre significa que uma delas resultará melhor do que a outra, então, porque raio é que não se faz apenas a que resulta melhor e se deixa de lado a alternativa menos perfomante?

É por medo. É isso mesmo, não há maior sinal de cagaço que um plano de marketing gigante. Os marketeiros lidam com ciências inexactas e podem sempre estar errados, o que já se sabe, é uma chatice, porque quem está errado... não lhe acontece nada, senão haveria ai muita gente sem os seus belos empregos, mas adiante. Os marketeiros nunca poderão ter certezas antes de tempo, mas faz parte da profissão ter de fazer escolhas, ainda que incertas. Ora, ao ser confrontado com a ausência de certezas, o marketeiro medroso prefere não escolher e fazer de tudo um pouco. Então, diligentemente, pega no orçamento e qual dúzia de ovos, distribui a coisa por vários cestos.

Fica assim identificada a causa da enfermidade, é excesso de ovos, ou de cestos. Porque quando vai se espalhando os ovos, só se consegue mini-omeletes. Depois, como um ovo estrelado não enche a barriga a ninguém, as iniciativas das marcas acabam mortas de fome sem que os resultados se vejam a aparecer. Isto, já sem contar com a trabalheira que dá gerir tantos cestos para os ovos. Estivesse tudo concentrado, numa grande iniciativa, ou num máximo de quatro por ano, e descobririam os marketeiros que para o que deve ser feito, têm nas equipas excesso de braços.

Na gestão das marcas, a preguiça pode até ser boa conselheira. Em vez de estafar equipas com listas intermináveis, é bem melhor escolher umas poucas e grandes coisas e apostar tudo quanto se tem em faze-las bem sucedidas. Afinal, desde os primeiros tempos da profissão que toda a gente sabe que a repetição é amiga das vendas. E vale a pena insistir, mesmo que sobrem mãos no departamento de marketing. Os excedentes, podem sempre encaminhá-los para as vendas. Os comerciais, são quem parte os ovos e para eles, uma mexida a mais é sinónimo de boa receita.

Opinião para o Meios&Publicidade

01/11/2005

Nitidamente ilógico ou notoriamente ineficaz.

É notório que, para uma empresa, faz muita diferença ser ou não ser conhecida. Isto porque pouca gente compra uma coisa que não conhece, tal como também não compra uma coisa que não encontra à venda. Assim sendo, desde muito cedo, as empresas perceberam que, para aumentar as vendas tinham antes de aumentar o reconhecimento da sua existência. O próximo passo foi chamar “notoriedade” ao facto de ser conhecido e criar a “propaganda” como forma de influenciar o efeito. Tudo isto se passava mais ou menos enquanto a electricidade chegava até às casas e o motor de explosão junto com a linha de montagem redefiniam o horizonte.

Desde então, e quase um século passado sobre o advento da “notoriedade”, é espantoso como ainda há marcas que perseguem a notoriedade, e gente que não a entende. Se não estivessem tão distraídos talvez tivessem reparado que desde o tempo em que a notoriedade era um objectivo útil aconteceram uma série de coisas com impacto no quanto sabem os consumidores. Essas novidades, em grupo, dão pelo nome de telecomunicações e incluem todas aquelas pequenas maravilhas como o rádio, a televisão, o telefone ou a Internet. Este conjunto faz uma família de geringonças que basicamente ditaram o fim do desconhecimento. Quando se tem a televisão por perto, não há limite ao que se pode saber. E como tal, o facto de não saber o que quer que seja deixou de ser uma objecção à venda.

Passado um século deviam os senhores anunciantes saber que tudo se pode saber, e a inútil notoriedade está agora ao alcance de um qualquer mini orçamento de media. Aliás, basta ver como num mísero mês marcas novas e desenterradas do nada (como a Millennium) atingiram altíssimos níveis de notoriedade, para perceber que a notoriedade não é coisa que deva preocupar os anunciantes.

Ora, se a notoriedade perdeu o viço com a invenção da televisão, o que é que a substituiu? Para alguns, o herdeiro da coisa terá sido a “notoriedade da publicidade”, uma abstracção que sugere que algo de bom viria para o negócio quando os consumidores identificassem um elemento neutro presente na publicidade. Mas a “notoriedade da publicidade” não faz nada pelas vendas porque ninguém se abstém de comprar uma coisa porque não se lembra da música do anúncio. Logo, a ”notoriedade da publicidade” é inútil para o negócio e quanto muito, um filho bastardo da original e em desuso notoriedade.

Quem veio substituir a caduca notoriedade foi a saliência, ou em inglês, o “top-of-mind”. De facto, o saber é uma coisa, já o lembrar-se é outra. E ainda que esteja em desuso ser a falta de conhecimento a limitar uma compra, muitas vezes acontece que essa compra não se faz porque tal alternativa simplesmente não ocorre. Um exemplo ilustrativo. O Montepio Geral é um banco que toda a gente conhece, tem uma altíssima, porque secular, notoriedade. No entanto, apesar dessa elevada notoriedade, nos últimos anos as vendas para os lados do mutualismo não eram muito excitantes. Ora, bastaria este episódio para demonstrar que a notoriedade não é relevante para as vendas. Mas a história continua. Já a seguir a esta constatação, e quebrando com o rotineiro cinzentismo dos bancos, o Montepio desencantou uma campanha bem marcante, que não diz nada a não ser que o banco existe. Com isto, os consumidores foram abruptamente relembrados da existência do Montepio e desataram a reconsiderá-lo nas suas compras de crédito. Deu-se na ocasião o caso do Montepio ter muito baixo top-of-mind, e resolveu-se o seu problema com uma campanha de elevada recordação. O sucesso dos Gatos no Montepio foi tal, que o dito banco tratou de voltar a insistir na campanha original. O que, sem certeza sobre o que ainda vai acontecer, promete ser uma má decisão, o Montepio já conquistou top-of-mind, por isso deixou de precisar de uma campanha de elevada recordação.

Em resumo. A notoriedade não interessa para as vendas. O que interessa é o Top-of-mind, mas mesmo esse só interessa para quem não o tem, seja porque é um anunciante pequeno que perde as vendas porque aos clientes não se lhes ocorre ali comprar, seja porque é um anunciante esquecido, que aos clientes já não lembra considerar. Ora, esta dificuldade, a do esquecimento pelo comprador não é mal de que sofram as muito grandes empresas. Não há de haver ninguém que não use electricidade porque não se lembre da EDP. Tal como muito pouca gente se esquece da Galp quando o depósito está vazio. As mega-empresas são tão omnipresentes que sempre têm notoriedade e top-of-mind de sobra. Tanto é assim que custa a perceber porque é que são estes os maiores candidatos a comprar nomes de estádios ou de portas.

A experiência nos Estados Unidos com inúmeras operações de renomeação dos estádios demonstra mais ou menos o seguinte: Os clubes arranjaram uma fantástica fonte de receita, facturando bons milhões de euros apenas para mudar os nomes de coisas. Enquanto isso, os consumidores ignoram os novos nomes com o mesmo Olimpismo com vão para o Rossio e dizem Terreiro do Paço. Já as empresas, embarcaram alegremente em mais uma despesa para a qual nunca chegarão a fazer as contas das receita.

Em termos práticos, a nomeação de uma coisa, seja um estádio, seja um campeonato pode interessar a quem tem um problema de top-of-mind ou até quem nem sequer tem notoriedade. É o caso da BetandWin, não há dúvida que por via de um favoravelmente polémico patrocínio, as receitas do site de apostas dispararam. Este tipo de negócios, subterrâneos e desconhecidos, tem tudo a ganhar com associações e nomeações. Mas, infelizmente, não costumam ter o dinheiro para as pagar. Já por outro lado, quem bem pode pagar estes luxos, são as grandes corporações que engordam protegidas em mercados milionários e pouco concorrenciais. Mesmo que, precisamente por serem demasiado grandes e gordas precisem de mais top-of-mind, tanto quanto lhes falta notoriedade.

O racional é muito simples. Se já é conhecido não precisa de ser conhecido. Logo quem é conhecido e vai pagar para ser conhecido, está a desperdiçar dinheiro. Mas como este raciocínio é simples e conduz a que não se faça uma quantidade de negócios com bilhetes VIP e outras mordomias, houve logo quem tratasse de inventar uma visão mais complicada para justificar o negócio dos nomes. Chamam-lhe a associação de marcas.

Dizem os artistas da associação de marcas que, ao juntar duas marcas elas passam fluidos de valores de um lado para outro, numa acção que pode contaminar o seu crescimento. Claro que desejado efeito pode acontecer, veja-se a entrada de leão da Parmalat em Portugal, quando a leiteira se associou firmemente aos eternos valores do anti-benfiquismo. Mas como as contaminações costumam ser uma coisa suja e desagradável, as marcas preferem uma troca mais ampla, e preferem associar-se a todos para não ficar conotado com nenhum. O que, prontos, até seria escusado dizer mas, se não é para ficar conotado, então porque é que se associam? Para nada, pois bem, está explicado assim que a nomeação de coisas por parte de marcas sobejamente conhecidas não traz vantagem para a marca que paga.

Afinal, lá porque nos Estados Unidos alguém fez, não é sinal suficiente para aqui se repetir. Bastaria atentar nos estádios com os nomes da Enron ou da Fruit-of-the-loom para entender que, se o Tio Sam se atirar de um precipício, vão dize-lo aos baptizadores de estádios porque os clubes de futebol andam aflitos de dinheiro.


Opinião Especial para o Jornal de Negócios