Momento de Balanço
Será verdade que 2 em cada 3 profissionais de “marketing” não sabe bem ao que anda? Será possível? Será aceitável que gestores de marca com orçamentos milionários se orgulhem de (são citações):
- “atingir o objectivo, que era confundir o consumidor”
- “fazer uma campanha para alargar o target”
- “subir o posicionamento com a campanha”
- “posicionar a marca em diferentes segmentos”
- “associar outros valores (contraditórios) aos que já tem associados”
Não seria de esperar que algumas coisas básicas e fundamentais da profissão fossem tão evidentes que asneiras destas fossem ridicularizadas com uma gargalhada?
Já por aqui passaram diversas teorias explicativas para o problema, notavelmente a primeira explicação avançada foi a da diferença entre “contabilistas” e “financeiros” (ou entre “técnicos” e “engenheiros”) aplicada ao marketing. Veneravelmente, Hugo, o autor, defende que nas profissões costuma ser feita uma distinção entre os que sabem e os que fazem. Ou entre os que percebem e os que repetem. Diferença essa que não é aparente no marketing e que permite muito amanuense por aí ande com estatuto de executivo. Permite por exemplo que exista um curso de “Engenharia Publicitária” sem que este seja protagonista do anedotário profissional.
Outra explicação para o problema da fraca competência dos profissionais das marcas pode ser encontrado na diferença (ou falta dela) entre Comunicação Social e Comunicação Empresarial. Pela lógica uma só formação não pode gerar simultaneamente jornalistas e publicitários. Pela lógica, quem tem um código deontológico e uma missão para com a verdade (jornalista), não pode ser o mesmo que tem como objectivo manipular a percepção para a tornar mais interessante. Ainda por cima, os jornalistas costumam ser fracos a matemática e não há coisa mais perigosa do que por um orçamento de milhões nas mãos de quem não faz contas.
Estas duas explicações, são virtuosas, mas também são muito “rosseaunianas”. Colocam toda a culpa, não no homem, mas na sua deseducação. Como se por obra de um sistema educativo utópico, tudo se resolvesse. Mas na verdade, a educação é apenas mais um reflexo do problema e não a verdadeira causa. O sistema é um bom bode expiatório, mas os problemas tendem a estar com as pessoas (com os indivíduos).
Cada vez mais, parece-me que o carácter enganador e viciado da “gestão de marcas” resulta da genuína vontade dos decisores, dos proprietários das marcas (desde o CEO da multinacional aos eleitores de uma junta de freguesia) em serem enganados. A charlatanice depende da colaboração dos iludidos. Uma empresa/instituição mal gerida é como um organismo gordo. Consome demasiados recursos para produzir de menos actividade. A comparação não é nova, mas neste tempos de obesa pandemia, é mais fácil de perceber. Acontece que a generalidade dos gordos prefere ser magro, só que não está disposto a percorrer o caminho que os leva até lá. A dieta, o exercício, as restrições, a força de vontade, a sensação de injustiça, a auto-responsabilização. Perder peso é uma trabalheira. Muito pouco gratificante. Assim sendo, os obesos, estão sempre (secretamente) à espera de uma solução milagrosa, imediata e indolor para o seu problema. Os obesos, no fundo, querem acreditar numa solução imediata e por isso, periodicamente, deixam-se cair na ilusão dos xás, das massagens e de todas essas outras coisas que não implicam esforço, logo não gastam calorias, logo não resultam.
Esta alegoria pode explicar porque é que os vendedores da banha da cobra publicitária têm tanto sucesso. Anda por aí muita empresa gorda que prefere acreditar que não precisa de mudar de vida. Por exemplo: A Vodafone é considerada uma empresa de sucesso, mas conseguiu perder 20 pontos de quota num mercado fechado à concorrência; A PT parece um exemplo de gestão, mas extorque 700milhões de euros por ano (em assinaturas) para sustentar um bem (a rede fixa) que “comprou” ao estado por apenas 235milhões; A Galp, missionaria, internacionaliza-se, mas as espanholas vendem mais gasolina em Portugal do que vice-versa. Enfim, estas empresas, gordas, em mercados pouco concorrenciais, são a nata das nossas corporações. E como gordas que são não querem fazer dietas, nem aguentar ginásticas. Preferem antes que alguém lhes diga que são lindas assim mesmo, e que esse alguém as pinte e maquilhe, para que, por artes pouco dolorosas, passem de gordas a voluptuosas.
A obesidade na gestão é contagiosa. Repare-se na quantidade de vezes que se ouve declarações do tipo: “não há espaço no mercado para...”. Como se os mercados fossem um espaço limitado? Como se não fossem os mercados (concorrenciais) uma abstracção onde, quem for melhor tem sempre lugar, nem que para isso expulse quem já lá estava. Ora, estar preocupado com a resistência ao peso de uma cadeira, é uma preocupação típica de um obeso. E quem mede os mercados pelo número de empresas “que lá cabem” é um gestor com um pensamento obeso. Por exemplo: Durante anos disse-se que o mercado dos jornais diários estava saturado, e que DN e Público apenas persistiam porque tinham bolsos mais fundos do que as receitas justificavam. Até que, numa assentada, entram no mercado dois diários gratuitos que chegam a 2x mais pessoas do os “instalados” e, mesmo sem vender o papel, são lucrativos. Afinal havia espaço.
E pronto, demonstrado que a obesidade é um problema endémico dos gestores, falta só concluir que os obesos preferem tomar comprimidos a fazer exercício. E por isso há e haverá sempre no mercado receita para todos os “nutricionistas” que prometem emagrecimento sem esforço e nem restrições. Enquanto isso, os “personal trainers” das empresas, aqueles que investem no trabalho, na eficiência, na racionalidade, para gerir as marcas, verão a sua carreira ofuscada pela charlatonice. Com a única compensação de saber que no final, mais cedo ou mais tarde. Não se pode disfarçar o peso a mais e os mais aptos serão aqueles que, no longo prazo, vão ganhar a corrida. Ou não.
Ou talvez não. Talvez não haja moral no final desta história. Talvez a seriedade das vendas coabite com a charlatonice da notoriedade da publicidade. Talvez o futuro seja ainda mais confuso do que já é o presente. Mas uma coisa é certa. Um ano depois do lançamento do “Compre Este Porque” passou por aqui gente que leu, que gostou e que se deu ao trabalho de o dizer. Noesis, RuiPaiva, Bruno, Rayban, são algumas das e-personalidades que me obrigam a persistir. E a quem (juntamente com os outros que estão na página de agradecimentos do livro) recorro agora num momento de indecisão.
- O artigo 14.MPE foi o último da série, vitima da sua própria pequenez e da falta de interesse editorial (foi recusado por uma quantidade demasiado grande de publicações).
- Por ter esgotado a fórmula, a segunda época no Meios&Publicidade não tem mais um grande objectivo final (como tiveram os artigos que originaram o “Compre Este Porque”) e limita-se a ser o que é. Um espaço de opinião que faço por merecer.
- O atrevimento do “Sexo no Supermercado”, iniciado com uma divertida crónica para a Cosmopolitan, resultou em divórcio motivado pelas insanáveis diferenças entre os próprios sexo e supermercado.
Estou por isto tudo em momento de balanço. Em nome da “boa” gestão de marcas como prosseguir? Como fazer melhor do que já está feito no “Compre Este Porque”? O que faz falta ou pode fazer a diferença para as marcas? Aceitam-se sugestões. Agradeço ao ilustre painel que por aqui opina, que o continue a fazer.
- “atingir o objectivo, que era confundir o consumidor”
- “fazer uma campanha para alargar o target”
- “subir o posicionamento com a campanha”
- “posicionar a marca em diferentes segmentos”
- “associar outros valores (contraditórios) aos que já tem associados”
Não seria de esperar que algumas coisas básicas e fundamentais da profissão fossem tão evidentes que asneiras destas fossem ridicularizadas com uma gargalhada?
Já por aqui passaram diversas teorias explicativas para o problema, notavelmente a primeira explicação avançada foi a da diferença entre “contabilistas” e “financeiros” (ou entre “técnicos” e “engenheiros”) aplicada ao marketing. Veneravelmente, Hugo, o autor, defende que nas profissões costuma ser feita uma distinção entre os que sabem e os que fazem. Ou entre os que percebem e os que repetem. Diferença essa que não é aparente no marketing e que permite muito amanuense por aí ande com estatuto de executivo. Permite por exemplo que exista um curso de “Engenharia Publicitária” sem que este seja protagonista do anedotário profissional.
Outra explicação para o problema da fraca competência dos profissionais das marcas pode ser encontrado na diferença (ou falta dela) entre Comunicação Social e Comunicação Empresarial. Pela lógica uma só formação não pode gerar simultaneamente jornalistas e publicitários. Pela lógica, quem tem um código deontológico e uma missão para com a verdade (jornalista), não pode ser o mesmo que tem como objectivo manipular a percepção para a tornar mais interessante. Ainda por cima, os jornalistas costumam ser fracos a matemática e não há coisa mais perigosa do que por um orçamento de milhões nas mãos de quem não faz contas.
Estas duas explicações, são virtuosas, mas também são muito “rosseaunianas”. Colocam toda a culpa, não no homem, mas na sua deseducação. Como se por obra de um sistema educativo utópico, tudo se resolvesse. Mas na verdade, a educação é apenas mais um reflexo do problema e não a verdadeira causa. O sistema é um bom bode expiatório, mas os problemas tendem a estar com as pessoas (com os indivíduos).
Cada vez mais, parece-me que o carácter enganador e viciado da “gestão de marcas” resulta da genuína vontade dos decisores, dos proprietários das marcas (desde o CEO da multinacional aos eleitores de uma junta de freguesia) em serem enganados. A charlatanice depende da colaboração dos iludidos. Uma empresa/instituição mal gerida é como um organismo gordo. Consome demasiados recursos para produzir de menos actividade. A comparação não é nova, mas neste tempos de obesa pandemia, é mais fácil de perceber. Acontece que a generalidade dos gordos prefere ser magro, só que não está disposto a percorrer o caminho que os leva até lá. A dieta, o exercício, as restrições, a força de vontade, a sensação de injustiça, a auto-responsabilização. Perder peso é uma trabalheira. Muito pouco gratificante. Assim sendo, os obesos, estão sempre (secretamente) à espera de uma solução milagrosa, imediata e indolor para o seu problema. Os obesos, no fundo, querem acreditar numa solução imediata e por isso, periodicamente, deixam-se cair na ilusão dos xás, das massagens e de todas essas outras coisas que não implicam esforço, logo não gastam calorias, logo não resultam.
Esta alegoria pode explicar porque é que os vendedores da banha da cobra publicitária têm tanto sucesso. Anda por aí muita empresa gorda que prefere acreditar que não precisa de mudar de vida. Por exemplo: A Vodafone é considerada uma empresa de sucesso, mas conseguiu perder 20 pontos de quota num mercado fechado à concorrência; A PT parece um exemplo de gestão, mas extorque 700milhões de euros por ano (em assinaturas) para sustentar um bem (a rede fixa) que “comprou” ao estado por apenas 235milhões; A Galp, missionaria, internacionaliza-se, mas as espanholas vendem mais gasolina em Portugal do que vice-versa. Enfim, estas empresas, gordas, em mercados pouco concorrenciais, são a nata das nossas corporações. E como gordas que são não querem fazer dietas, nem aguentar ginásticas. Preferem antes que alguém lhes diga que são lindas assim mesmo, e que esse alguém as pinte e maquilhe, para que, por artes pouco dolorosas, passem de gordas a voluptuosas.
A obesidade na gestão é contagiosa. Repare-se na quantidade de vezes que se ouve declarações do tipo: “não há espaço no mercado para...”. Como se os mercados fossem um espaço limitado? Como se não fossem os mercados (concorrenciais) uma abstracção onde, quem for melhor tem sempre lugar, nem que para isso expulse quem já lá estava. Ora, estar preocupado com a resistência ao peso de uma cadeira, é uma preocupação típica de um obeso. E quem mede os mercados pelo número de empresas “que lá cabem” é um gestor com um pensamento obeso. Por exemplo: Durante anos disse-se que o mercado dos jornais diários estava saturado, e que DN e Público apenas persistiam porque tinham bolsos mais fundos do que as receitas justificavam. Até que, numa assentada, entram no mercado dois diários gratuitos que chegam a 2x mais pessoas do os “instalados” e, mesmo sem vender o papel, são lucrativos. Afinal havia espaço.
E pronto, demonstrado que a obesidade é um problema endémico dos gestores, falta só concluir que os obesos preferem tomar comprimidos a fazer exercício. E por isso há e haverá sempre no mercado receita para todos os “nutricionistas” que prometem emagrecimento sem esforço e nem restrições. Enquanto isso, os “personal trainers” das empresas, aqueles que investem no trabalho, na eficiência, na racionalidade, para gerir as marcas, verão a sua carreira ofuscada pela charlatonice. Com a única compensação de saber que no final, mais cedo ou mais tarde. Não se pode disfarçar o peso a mais e os mais aptos serão aqueles que, no longo prazo, vão ganhar a corrida. Ou não.
Ou talvez não. Talvez não haja moral no final desta história. Talvez a seriedade das vendas coabite com a charlatonice da notoriedade da publicidade. Talvez o futuro seja ainda mais confuso do que já é o presente. Mas uma coisa é certa. Um ano depois do lançamento do “Compre Este Porque” passou por aqui gente que leu, que gostou e que se deu ao trabalho de o dizer. Noesis, RuiPaiva, Bruno, Rayban, são algumas das e-personalidades que me obrigam a persistir. E a quem (juntamente com os outros que estão na página de agradecimentos do livro) recorro agora num momento de indecisão.
- O artigo 14.MPE foi o último da série, vitima da sua própria pequenez e da falta de interesse editorial (foi recusado por uma quantidade demasiado grande de publicações).
- Por ter esgotado a fórmula, a segunda época no Meios&Publicidade não tem mais um grande objectivo final (como tiveram os artigos que originaram o “Compre Este Porque”) e limita-se a ser o que é. Um espaço de opinião que faço por merecer.
- O atrevimento do “Sexo no Supermercado”, iniciado com uma divertida crónica para a Cosmopolitan, resultou em divórcio motivado pelas insanáveis diferenças entre os próprios sexo e supermercado.
Estou por isto tudo em momento de balanço. Em nome da “boa” gestão de marcas como prosseguir? Como fazer melhor do que já está feito no “Compre Este Porque”? O que faz falta ou pode fazer a diferença para as marcas? Aceitam-se sugestões. Agradeço ao ilustre painel que por aqui opina, que o continue a fazer.